Intriga-me
- Ele já te espera! – Não consegui perceber o que querias dizer com isso!
- Ele?
- O sonho! – Sorri meia convencida, mas sem perceber na verdade o que aquilo queria dizer!
Demorei a adormecer… Estava cansada, mas algo me prendia naquela noite! Talvez a promessa de ficar ali para se um amigo precisasse!
Quando a exaustão tomou posse de mim, deixei os músculos relaxarem… deixei-me ir leve, como quem deambula pela estrada dos sonhos sem destino!
Lá estava ele…
O porte largo, a pele morena, olhar triste… mas desta vez, sem o sorriso alegre! Estava sentando num tronco numa praia… Mas não a praia do outro sonho e eu também não estava presente naquela semi-realidade que sentia e via como um sonho! Era como se eu visse a película de um filme q não lhe pudesse tocar…
Estava com o mesmo olhar, sombrio… com algo a pesar-lhe no peito e que transparecia no castanho vivo dos seus olhos! Fitava o mar, como se procurasse respostas, como se só ele o entendesse na sua inteira complexidade! Tinha o corpo curvado, denotando-se a evidente exaustão e mesmo no seu ar desleixado de quem tem dado mais horas ao tempo do que as que o seu relógio gasto permite, tudo transparecia a sua beleza simples, natural, única!
Cobriu o rosto com as mãos e entregou-se ao que já à tanto tempo se notava que o estava a encher, a transbordar… Por entre os seus dedos escorriam lágrimas que lhe molhavam os braços num percurso desnorteado escorrendo até aos cotovelos calejados e deixando-se cair lentamente na areia húmida, bem ao lado dos seus pés descalços! Era esse o seu curso, o destino inevitável das suas lágrimas…reencontrar-se com as águas salgadas do mar que fazia parte de si mesmo!
Quis afagar-lhe o cabelo, devolver-lhe o abraço e o sorriso do outro sonho… mas era impossível! Eu não fazia parte do sonho! Eu era só uma espectadora, a única talvez, daquele filme triste!
Ao acordar… não precisei de vozes que me dissessem que aquele momento não podia ser esquecido, ele estava nítido na minha memória! Nítido de mais…
Intriga-me o facto de me sentir tão presa a este homem, de sonhar com o que ele sente, como se eu fosse uma parte inseparável dele… Intriga-me não o conhecer, mas intriga-me ainda mais que ele se pareça tanto contigo!
Clara Rodrigues
28-6-2006
Acreditas no sentido dos sonhos?
Acreditas no sentido dos sonhos?
Hoje tive um sonho
Acho que estava a dormir
Dentro de mim
Uma voz não parava de dizer
Que eu não podia esquecer aquilo
Que quando tudo terminasse
Eu tinha que me lembrar!
E a verdade…
É que me lembro!
Tu acreditas no sentido dos sonhos?
É que eu não consigo achar sentido neste!
Estava naquele lugar
Naquele lugar único
Onde eu estive
Que me lembrou de ti
O lugar onde te sonhei levar
Havia um homem
Um homem de olhar triste
Com um sorriso sincero
Como se tivesse encontrado
A luz para lhe voltar a dar brilho aos olhos
Havia um homem
E eu!
Ele vestia a tua roupa
Reconheço bem
Mas não eras tu!
Ele aproximava-se
Não falava
Não quebrava nenhuma regra
Nenhuma moral
Não tinha gestos impróprios
Nem atitudes inapropriadas
Só me abraçava
Um arrepio
O encolher do meu corpo nos seus braços
A voz que gritava cada vez mais alto:
“Não te podes esquecer!”
“Não te podes esquecer!”
Um sorriso
Depois um riso
Uma gargalhada
Um:
“Nunca ninguém me abraçou assim antes”
Mais um arrepio
E outro abraço
Mais um sorriso
Um riso
Uma gargalhada
E um:
“Não te podes esquecer disto!”
Acordei sem me lembrar
Sem palavras
Imagens
Recordações
Como na maioria das vezes
Emergi na banheira
E permaneci de olhos fechados
A água a escorrer no meu rosto
Só eu
O som da água
Num momento
Surge a imagem de um lugar especial
De um homem
De um olhar triste e sorriso feliz
Um abraço
Um arrepio
Um:
“Não te podes esquecer disto!”
Tu, acreditas mesmo no significado dos sonhos?
Clara Rodrigues
14-06-06
Morta
9-2-2006
Sinto-me presa aqui… é como se tivesse um fogo a arder cá dentro, um fogo que não consigo manter dentro de mim! Isto que me obriga a ficar presa, a ficar quieta…está a exigir um rebentamento de mim mesma, um rebentamento interior que não sei explicar! É como se as veias, as artérias, transportassem um sentimento tão grande, tão enorme para canais tão curtos, tão estritos! Vou rebentar! Vou cair! Vou explodir…
Deixo a minha alma voar livre pelas imagens do meu corpo jazido no chão desta sala compactada pelo stress… o meu corpo gélido, frio inerte, com uma cor avermelhada a rosar-me as faces, pelo alastrar no sangue que foge das artérias rebentadas! Os meus olhos vazios fixos na janela, no céu, para além… para o longe que eu própria anseio atingir, rapidamente, neste mesmo exacto momento!!!
O meu corpo… no chão, morto! E a minha alma, finalmente livre, solta, renascida!
Madalena Rocha
Medo
3-2-2006
Abraça-me do tempo, do mundo… Ninguém, é tamanho o vazio que tenho no peito, que o meu maior desejo é morrer!
Que diria toda a gente se me ouvisse falar assim? Não sei, não me interessa… Toda a gente fica em pânico quando se fala em morte, não sei porquê! Nunca percebi! Parece que proclamam Deus e o Reino dos Céus, mas depois caem na ironia de morrer de medo de morrer! E isto é uma coisa tão parva de se dizer!
Se deveras acreditamos que Ele existe e que tudo a Seu lado é tão maravilhosamente bom, porquê ter medo de ir? Porquê ter medo de partir à descoberta? Onde está a fé desta gente? Tenho pena deles, mas mais pena de quem não conhece Deus, de quem não crê… esses sim, têm razão para ter medo! Pobres coitados!!!
Protege-me, leva-me daqui para fora… Viver no meio desta gente medrosa, faz-me ter náuseas! Leva-me para junto do meu Pai, já não aguento mais estar aqui!
Madalena Rocha